10 janeiro 2006

o quadrado









Era uma vez um paulista que sentiu que sua vista estava muito estranha, enquadrando formas orgânicas compulsivamente, sem conseguir mais entender a água, nem absorver a visualidade das nuvens, muito menos contactar a sutileza da liberdade humana.
Compreender as disformes verdades psicológicas, sociológicas e antológicas dos seres humanos lhe parecia algo tão distante e impossível quanto arredondar um prédio. Se algo é volúvel, esse algo não há. Se algo se transforma, esse algo não. Se algo não possui cor definida, não pode essa cor.


O paulista ficou na sua kitinete observando o teto quadrado, a tela da tv, a janela retangular, o armário e suas portas, os tacos no chão, a própria imagem no espelho (que enquadrava sua organicidade em um suporte translúcido), o banheiro, apertado... Sentia-se sufocado. Sufocado por quadrados. Cubos. Retângulos. Ângulos. Pontuais. Retos. Concretos. Sabia, misteriosamente, e com uma certeza nunca antes experimentada, que algo estava errado. Precisava retomar. Relembrar.

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